Etanol caro deixa motorista sem opção para encher o tanque
Para especialistas, o cenário reflete restrições de oferta do produto e a busca das usinas por maiores margens.
(FOLHAPRESS) — Alternativa para os motoristas em tempos de gasolina cara, o etanol hidratado vem se mantendo em patamares elevados de preço e hoje só é competitivo em cinco estados brasileiros. Para especialistas, o cenário reflete restrições de oferta do produto e a busca das usinas por maiores margens.
De acordo com dados da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis), o preço médio do combustível nos postos brasileiros voltou a se aproximar da casa dos R$ 5 por litro, onde esteve por 15 semanas entre outubro de 2021 e janeiro de 2022.
O cenário põe o combustível entre os principais vilões da inflação. Em 12 meses, o preço do etanol subiu 24,59%, segundo o IPCA, índice oficial de inflação do país. No mesmo período, o preço da gasolina subiu 27,48%.
A alta das últimas semanas é atípica, já que os preços costumam cair com a proximidade da colheita da cana-de-açúcar, que começa em abril, e reflete repasse às bombas do aumento da cotação do combustível nas usinas de São Paulo, referência de preços no país.
Nas últimas quatro semanas, o preço do etanol nas usinas paulistas subiu 17%, segundo dados do Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada), da Esalq/USP. Em média, o etanol hidratado foi vendido a distribuidoras em março por R$ 3,1204 por litro, 11,7% acima de fevereiro.
Em seu último boletim mensal de análise do indicador, o Cepea afirma que a oferta do combustível está baixa e houve um aumento da demanda em março com postos renovando estoques para atender a elevada demanda do feriado de Carnaval.
Dados da Unica (União da Indústria de Cana de Açúcar) apontam que a produção de etanol caiu 8,9% na safra 2021/2022, em relação ao volume produzido na safra anterior. Além da preferência pela produção de açúcar, a seca que atingiu as regiões Sudeste e Centro-Oeste atrapalhou a produção.
Executivos do setor dizem ainda que os usineiros tendem a elevar o preço quando a gasolina está mais cara para melhorar margens. “Sobe o preço da gasolina na bomba, sobe o preço do etanol também. O produtor quer ganhar mais. Isso é natural”, diz o consultor David Zylbersztajn, ex-diretor da ANP.
Com a gasolina cara, a demanda pelo etanol se aquece, o que ajuda também a pressionar os preços nas bombas, com busca de melhores margens pelos postos revendedores.
A Unica diz que houve uma corrida de distribuidoras pelo produto nos meses de fevereiro e março, o que acabou afetando os estoques. “Teve um choque de demanda sem a contrapartida da oferta”, argumenta o diretor-técnico da entidade, Antonio de Padua Rodrigues.
Entre janeiro e fevereiro, segundo dados da ANP, as vendas de hidratado subiram 10%. Pádua diz que o movimento se manteve no mês seguinte, diante da boa competitividade do etanol. “O estoque disponível não foi suficiente para esse tipo de demanda”.
Ele destaca, contudo, que a oferta de etanol tende a aumentar a partir da segunda quinzena de abril, quando as usinas começam a processar a nova safra. “É uma questão de curtíssimo prazo”, diz. O período de entressafra da cana vai de dezembro a março.
Com a alta nas bombas, usar etanol hidratado hoje só é vantajoso em estados produtores, como São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, e no Piauí. Nesses estados, o preço médio do etanol equivale a menos de 75% do preço médio da gasolina.
Em todos os outros, pode ser melhor para o consumidor abastecer com gasolina, mesmo com os elevados preços atuais após o mega-aumento promovido pela Petrobras há quase um mês — segundo a ANP, o preço médio da gasolina no país foi de R$ 7,202 por litro na semana passada.
No Amapá, longe dos principais produtores, o etanol hidratado chega a custar mais caro do que a gasolina: o preço médio do primeiro na semana passada era de R$ 6,540 por litro, enquanto a segunda saía a R$ 6,331 por litro.